quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

GENTILEZA vs SR.do ADEUS


Há momentos que nos marcam para sempre, nem todos pelos melhores motivos mas este foi sem dúvida um marco, um pilar, uma inspiração: ouvi contar uma história verídica num concerto que assisti há uns 10 anos atrás, pelas palavras da cantora Marisa Monte, que me inspirou e ciclicamente me vem à memória – a história de uma figura carismática da cidade carioca nos idos anos 70/80.


José Datrino, mais conhecido como profeta Gentileza, usava barba comprida, vestia túnicas brancas e deambulava pela cidade proferindo palavras de amor e união entre todos. O “Profeta Gentileza”, como ficou conhecido, começou a sua jornada como personagem andarilho. Era visto em ruas, praças, nas embarcações da travessia entre as cidades do Rio de Janeiro e Niterói, em comboios e autocarros, enquanto fazia a sua pregação, levava palavras de amor, bondade e respeito pelo próximo e pela natureza a todos os que se cruzassem no seu caminho.

Também fazia umas inscrições muito peculiares nos pilares de um viaduto pelo qual passavam milhares de viaturas todos os dias, em tons nacionalistas “verde-amarelo” para dar bem nas vistas, criticando alguns aspectos mundanos da sociedade e sugerindo alternativas ao mal-estar da civilização moderna. Um dos seus intuitos era acender sorrisos nos rostos cinzentos dos automobilistas tornando assim o seu dia mais feliz.

Com o decorrer dos anos, os murais foram sendo danificados por grafittis, sofreram actos de vandalismo, e mais tarde foram cobertos com tinta de cor cinza. A eliminação das inscrições foi criticada e posteriormente com ajuda da prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, foi organizado o projecto “Rio com Gentileza”, com o objectivo de restaurar os murais dos pilares. Em 2000, já após a morte do “Gentileza”, o restauro das inscrições foi concluído ficando assim parte do património urbano carioca preservado.

Na cidade de Lisboa tivemos a figura do “Sr. do Adeus”, que nos deixou há bem pouco tempo, que sempre me fez lembrar esta história: no fundo, o que os motivava era o mesmo desejo de irradiar o rosto fechado de quem é obrigado todos os dias a seguir rotinas enfadonhas e a proporcionar-lhes, quanto mais não fosse, o esboçar de um sorriso por entre o caótico trânsito.

Não duvido que haja algumas estrelas no céu que brilham mais que outras: são almas como estas que ficam a olhar por nós, ainda que distantes, estão próximas… pelo menos eu continuo a sorrir cada vez que passo no Saldanha! 

ilustração de Corleone

P.S. E que a estátua não fique esquecida, seria uma justa homenagem para a posteridade.

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