sexta-feira, 27 de julho de 2012

SENTE-SE... MESMO O QUE NÃO SE VÊ



o 2º exercício de EC:

Ai, o que eu adoro festas, em especial se for um casório. Mas o casamento dos meus primos António e Violeta foi diferente da maioria.



Estava uma tarde calma e solarenga e a brisa trazia-nos o cheiro quente do campo lavrado. Ao chegar à igreja ouvi o sino tocar anunciando o início da boda. Entrei e apercebi-me que os convidados estavam num frenesim… um sussurro constante anunciava que alguém se atrasara, desta vez teria sido… O PADRE?!?. Ouvi alguém segredar que se teria deslocado a outra paróquia por causa de uma emergência mas pelos vistos ninguém avisou o sacristão para não dar uso ao badalo (salvo seja) suspenso na torre, à hora marcada.

Nada de mais, passados uns minutos apareceu e antes de prosseguir desfez-se em mil desculpas dando, de imediato, seguimento à cerimónia e, em menos de nada, já os noivos estavam no átrio com uma chuva de pétalas e grãos de arroz a pontuar o espaço entre o ladrilho irregular e as figurinhas esguias suspensas no pórtico de pedra talhado pois alguém um dia se lembrou que os santinhos também gostam de testemunhar estes delírios terrenos. O agradável odor que estava no ar e a temperatura que se sentia nos ombros, remetia-nos para uma Primavera em flor, como que a apaziguar a inquietude dos recém-casados.



Um ronco de motor de um carro antigo revelou o transporte que os iria levar a caminho da lua-de-mel. Ao mesmo tempo ouviam-se foguetes ao longe de tal maneira que a passarada levantou vôo, pelo bater das asas, apressada.

Ao passarem no corredor ladeado pelas roseiras bravas, o vestido da noiva fica preso nos espinhos, “será que largar pedaços de tecido também dá sorte?!?”, disse ela em tom divertido. Agarro no pequeno retalho deixado para trás e entre as mãos reconheço as rendas antigas da avó guardadas no baú do sótão que adorávamos explorar: a textura pontiaguda da pintura das paredes, das telas adornadas com fiadas de teias de aranha nos cantos, as arcas de madeira com cheiro a óleo de cedro, os tapetes persa muito macios com as franjas que teimavam estar sempre em desalinho mas que eu insistia em pentear… o ladrar do Tobias ao longe, nas plantações, provavelmente atrás das fugidias toupeiras.

Ainda hoje, confundo os sons e os cheiros com as imagens que imagino e se sucedem nos meus pensamentos.


Escrever txt sobre uma festa de casamento sem recurso à visão

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